sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016

"A Visiona de olho na Terra"

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A Visiona de olho na Terra

Ivan Plavetz

Sensoriamento remoto através de satélites é, atualmente, um instrumento de grande valor técnico, científico e estratégico em muitas áreas da atividade humana, entre elas, cartografia plana e 3D, monitoramento e proteção ambiental, prospecção de jazidas minerais, acompanhamento da evolução urbanística das cidades, inspeção e avaliação de mananciais hídricos, chegando até aos levantamentos de interesse militar (inteligência, monitoramento marítimo e mapeamento de terrenos). De olho nesse mercado, a brasileira Visiona Tecnologia Espacial acaba de lançar um projeto de prestação de serviços nessa área.

A demanda

A Visiona Tecnologia Espacial, uma empresa do grupo Embraer e Telebras, foi criada há três anos como integradora de satélites. Em nível mundial, como negócio, cerca de 80% dessa atividade depende e é desenvolvida com apoio governamental, sendo que no Brasil isso acontece da mesma forma. De acordo com Eduardo Bonini, seu presidente, em conversa com a reportagem de T&D, paralelamente à expectativa de oferecer soluções de construção e integração de satélites, a companhia decidiu seguir um modelo de negócio consagrado entre fabricantes espalhados ao redor do mundo. Os fabricantes de satélites também oferecem prestação de serviços usando esses veículos espaciais, sejam eles de comunicações ou de observação terrestre, entre outras aplicações.

Alinhando-se a esse modelo, a Visiona optou por entrar em um negócio que não depende de projetos esporádicos como a integração. Um projeto de satélite leva ao redor de três a três anos e meio. Como a empresa precisa de fontes contínuas de renda, ela definiu o lançamento de um serviço de fornecimento e análise de imagens com o objetivo de desenvolver grandes planos para sensoriamento remoto no Brasil e países vizinhos.

Para tanto, a Visiona estudou cuidadosamente a contratação de parceiros e suas respectivas constelações de satélites já em operação. A empresa já sabia que seus proprietários atuam de forma global, entretanto, conseguiu concessões para aplicações sobre solo brasileiro, latino-americano e algumas regiões da África. Para Bonini, desenvolver negócios nesses mercados dependerá da capacidade da empresa, contudo, ele considera o Brasil o grande foco desse nicho, pois as necessidades são muito maiores do que já está sendo feito no País e há boas chances de sucesso.

Com base em recente estimativa divulgada por fontes governamentais, o Brasil gasta por ano cerca de R$ 100 milhões em atividades de imageamento específicas para sensoriamento remoto. A despeito do ainda baixo nível de emprego dessa ferramenta por aqui, existe um crescimento mundial de 10% ao ano correspondente ao emprego dessa tecnologia, o que demonstra o significativo potencial de mercado existente e a viabilidade de explorá-lo, estimando-se que daqui a 10 anos poderá estar movimentando anualmente no País em torno de R$ 200 milhões.

A Visiona, segundo Bonini, possui uma visão de mercado que prevê uma grande demanda por sensoriamento remoto não somente por satélites dotados de sensores ópticos, mas, também por radar. A gama de aplicações é vasta, incluindo planejamento territorial, levantamentos nos campos da energia, agrícola, agropecuária e florestal e controle de fronteiras, bem como prevenção, acompanhamento e avaliação de consequências de desastres naturais. Portanto, em função desse volume de aplicações e as dimensões do território brasileiro, cabe o uso de uma ampla constelação de satélites de observação.

Parcerias e constelação

Para desenvolver seu projeto, a empresa firmou acordos de distribuição de imagens com alguns dos principais operadores de satélites de observação da Terra: Grupo Airbus, a norte-americana DigitalGlobe, a japonesa Restec, e a sul-coreana SI Imaging Services.

Por meio dos acordos firmados com essas corporações, a Visiona formou uma constelação virtual de satélites, ou seja, cada uma das empresas parceiras possui a sua constelação de satélites, sendo que cada uma delas irá fornecer de forma independente imagens para a Visiona. Dessa forma, será possível obter um conjunto de imagens com características únicas do mesmo assunto a partir de satélites de constelações diferentes, resultando na capacidade de coletar grandes volumes de imagens com altas taxas de revisita (as quais podem ser diárias), ou seja, o cliente tem a seu dispor imagens registradas em intervalos de tempo de acordo com suas necessidades. A grande diversidade dos sensores presentes nessa constelação permitirá que a empresa forneça soluções superiores para as mais variadas aplicações de sensoriamento remoto, enfatizou Bonini.

No total, a empresa terá acesso unificado a uma constelação composta por 22 satélites (ver box) que percorrem orbitas circulares baixas com menos de 2.000 km de altitude (LEO - Low Earth Orbit), sendo 18 deles dotados de sistemas de sensores ópticos capazes de gerar imagens pancromáticas e multiespectrais de média, alta e altíssima resolução espacial, com várias faixas de cobertura de terreno, isso com resoluções de 31 centímetros a 22 metros, e três satélites com capacidade de sensoriamento por radar SAR com resoluções de 25 cm a 95 m que funcionam nas Bandas X e L, esta última tecnologia única no mundo, particularmente importante para atendimento dos requisitos legais e técnicos do monitoramento ambiental do País. “Poucas empresas no mundo conseguiram montar uma constelação virtual com esta capacidade. Esses satélites representam o que há de mais moderno atualmente”, destacou o presidente da Visiona.

Bonini ressaltou que tão importante quanto conseguir esses acordos para a composição da constelação virtual são os investimentos feitos na equipe brasileira. Para que as imagens recebidas tenham valor agregado precisam ser trabalhadas para que forneçam exatamente as informações que o cliente necessita. Isso depende de especialistas e a Visiona foi buscá-los, trazendo o que há de melhor em experiência, não só em termos de habilidade comercial, mas também para processamento e interpretação das imagens. A equipe será composta por engenheiros, geólogos e profissionais de outras especialidades aplicáveis na atividade, graduados nos níveis de mestrado e doutorado.

Em conjunto com a Bradar, empresa do grupo Embraer voltada ao sensoriamento remoto através de equipamentos de radar SAR aerotransportados, a Visiona passará a fornecer soluções hibridas empregando sensores embarcados em aviões e satélites, entregando serviços de alto valor agregado como mapas temáticos e de detecção de mudanças. Poderá, ainda ocorrer associações com outras empresas que já atuam no Brasil com objetivo de desenvolver novas soluções e promover a adoção de tecnologias de sensoriamento de modo a fomentar o surgimento de programas de satélites nacionais.

Amazônia SAR e o CBERS

Entre os projetos que a empresa tem condições de abraçar fi gura o Amazônia SAR, que envolverá satélites dotados de sensores radar tipo SAR, mais eficiente para o monitoramento daquela região com constante presença de nuvens, e reduzem o desempenho dos sensores ópticos. Esse tipo de sensor pode não só ver o que há abaixo dessas formações atmosféricas, mas o que a vegetação esconde abaixo da copa das árvores, por exemplo. Um ponto de destaque do Projeto Amazônia SAR é a possibilidade futura de um satélite nacional empregando tecnologias já desenvolvidas no Brasil e contanto com parcerias internacionais. O emprego da constelação de satélites já existente é imediata, enquanto o desenvolvimento de um satélite brasileiro deverá levar em torno de quatro anos.

Com relação aos satélites de sensoriamento remoto sino-brasileiros da família CBERS, a Visiona poderá complementar os serviços que prestam para as instituições que se servem das imagens coletadas por esses satélites. Os CBERS são satélites dotados de sensores ópticos de baixa resolução e a complementação se daria também com imagens fornecidas pelos satélites radares da constelação virtual contratada pela Visiona durante períodos nos quais as áreas de interesse estiverem “opticamente inacessíveis”, Além disso, considera-se também a periodicidade das passagens do CBERS pelos mesmos pontos da superfície terrestre (26 dias para o CBERS-4 completar um ciclo) em comparação com os curtos ciclos de revisita disponibilizados pelo sistema de satélites empregado pela Visiona.

Em termos de integração, a empresa trabalha no sistema do Satélite Geoestacionário de Defesa e Comunicações Estratégicas (SGDC), que vai atender às necessidades de comunicação via satélite do Governo Federal, incluindo o Programa Nacional de Banda Larga (PNBL) e um amplo espectro de comunicações estratégicas de defesa. Ela tem também meta de atuar como integradora de satélites no âmbito do Programa Nacional de Atividades Espaciais (PNAE/AEB) e do Programa Estratégico de Sistemas Espaciais (PESE/FAB).

Expectativas

Segundo informou Bonini, no Brasil existem muitas carências em torno do desenvolvimento da soberania em relação ao espaço. Essa forma de começar a trabalhar, ou seja, fornecendo imagens e oferecendo a parte de sensoriamento, é uma primeira aproximação com os clientes brasileiros que poderiam, mais tarde, através de vários demandantes e ministérios que utilizam imagens coletadas por satélites, trabalharem em sinergia no âmbito de projetos de satélites nacionais, tanto ópticos quanto dotados de sensor-radar. “Sabemos hoje que a demanda da área de defesa por um satélite de observação com uma câmera de 1 metro de resolução é muito importante”, disse. Ele ponderou que se esse investimento é grande demais, pode ser dividido, por exemplo, entre os Ministérios da Defesa, do Meio Ambiente, da Agricultura, e outros, sendo que essa cooperação entre instituições oficiais que demandam essas imagens, incluindo compartilhamento de investimentos, iria resultar em benefícios coletivos decorrente da aplicação dessa tecnologia por meio de satélites nacionais, criando a oportunidade de elevar o Brasil para outros níveis no desenvolvimento de satélites e exploração do espaço.

Em síntese, a Visiona trabalha com perspectivas de longo prazo. Neste primeiro momento, conta com um banco de imagens coletadas por cada constelação dos seus parceiros internacionais, e estão sendo armazenadas independentemente se serão usadas ou não. Há também um banco de imagens gerados pela Bradar. A Visiona esta preparada para editoração desses acervos para atender potenciais clientes. O que interessa nessas imagens é o histórico nelas contidos, ou seja, a possibilidade de, por comparação com as atuais, acompanhar a evolução de desmatamentos. A empresa dispõe de ferramentas para a obtenção e arquivamento de imagens e seu processamento, acrescentando o valor das interpretações dos especialistas.

Os planos são para ir mais longe atingindo a capacidade de obter imagens diretamente das constelações, agilizando o processo e permitindo o seu controle pela Visiona, o que vai requerer infraestrutura incluindo antenas de múltiplo espectro cuja integração careceria de investimentos da ordem de R$ 15 a 20 milhões. Numa etapa mais avançada, o ideal seria integração de satélites nacionais no sistema, podendo, juntamente com organismos estatais, os quais teriam a propriedade dos mesmos, explorar a geração de imagens para um leque total de atendimento.


Fonte: revista Tecnologia & Defesa n.º 143, janeiro de 2016.
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